sábado, 8 de agosto de 2015

ANA E JOÃO - ÚLTIMO CAPÍTULO ( A CASA ) - PARTE 2

parte 2

A luz atingiu o espelho e refletiu sobre seus olhos. 

Sua imagem foi a primeira coisa que viu ao abrir a porta da casa. O espelho estava pendurado na parede oposta da sala. Deu passos ansiosos dentro daquele universo preservado pelas mãos de Obedina. Gracioso. Foi a palavra que surgiu em sua mente. Simples e graciosa. Naquele espaço os pais haviam construído sua história de amor e que ainda perdurava. Imortal.

O que é bom sobrevive. Rompe as fronteiras do tempo. Exala e se apega a pele. Assim como o mal. A luta é constante e ferrenha.

O tecido verde adamascado decorado com anêmonas do sofá de dois lugares já demonstrava esmaecimento. Mas os sinais do tempo haviam proporcionado um efeito harmônico e interessante.

Num canto da parede havia um aparador de madeira escura e sobre ele uma única fotografia em preto e branco. Um casal sorridente. Ele a abraçava com as duas mãos pousadas sobre seu ventre.

No centro da parede oposta um toca-discos vintage servia também de ornamentação. Ajoelhou-se diante dele e abriu a portinhola de madeira sob o aparelho encontrando alguns discos enfileirados. Sorriu. Aquela era uma casa que gostava de música. Seus dedos puxaram o primeiro que tocou.

A curiosidade a impeliu a olhar por trás do aparelho onde ela encontrou o fio pendurado. Adaptou o plug à tomada e ligou o aparelho. Removeu o disco de sua capa e colocou para tocar. Uma música de Bernie Taupin e Elton John. Seu peito inflou ao som da canção. A letra era simples e marcante. Deixou a agulha percorrendo as trilhas do vinil, se levantou e continuou em sua viagem exploratória.

Caminhou até o corredor. Imediatamente foi atingida por uma brisa que não soube de onde se originava. Instintivamente dirigiu-se ao quarto no fim do corredor. Nele, uma janela basculante iluminava o ambiente. Havia uma cama de casal coberta por uma colcha de renda branca, uma cômoda a seu lado e uma penteadeira recostada à parede, de frente para o leito.

Moveu-se lentamente até a penteadeira constituída de três espelhos articulados bisotê, sentou-se no banquinho sem encosto e viu sobre o móvel uma escova de cabelos e um porta joias de madeira. Ia abrir a caixa mas algo na escova chamou-lhe atenção. Ela tomou-a e viu alguns fios claros presos nas cerdas. Tocou com reverência, temendo que depois de tantos anos de persistência a evidência material se desintegrasse ao seu contato. Olhou-se no espelho e percebeu com um senso de identidade que a cor dos fios eram semelhantes ao seu.

Ergueu-se e foi à cômoda. Abriu a primeira gaveta. Um pequeno ramo florido seco estava sobre uma pilha de roupas amareladas. Ela tocou os tecidos. A maioria de algodão. As outras gavetas estavam vazias.  

No quarto contíguo, viu três colunas de livros de mais ou menos um metro cada, dispostos ao lado de uma escrivaninha. Em uma caixa, diversos canudos de papel testificavam sobre a natureza do trabalho realizado por seu pai. Tomou o livro que estava no topo da primeira coluna. Havia uma grossa camada de poeira sobre ele. Leu seu título. ModiglianiA maioria dos livros versavam sobre arte, arquitetura ou engenharia. Um pequeno tesouro de conhecimento.

Se dirigiu ao primeiro e último quarto. Abriu a porta e viu o berço diante de um janela alta por onde entrava uma réstia dourada que iluminava a poeira suspensa no ar. Era o seu quarto. Caminhou devagar e com cuidado, como se não quisesse acordar o bebê, mas seu pé deslocou um taco de madeira solto. Ela o empurrou para o lugar com o pé. Então aproximou-se do pequeno ninho e tocou a estrutura de madeira onde ela teria dormido, se os eventos tivessem sido diferentes. Queria ter o poder de ouvir as palavras que haviam sido pronunciadas ali. Se aquelas paredes pudessem falar. Queria poder captar os sentimentos que haviam circulado aqueles ares.

Voltou a sala e percebeu que havia deixado a porta da frente aberta. Quando estava para fechá-la, percebeu que havia um aglomerado de pessoas diante do portão. Certamente haviam sido atraídas pela música da casa abandonada. A casa ferida. E como havia lhe dito a primeira pessoa com quem havia entrado em contato naquela rua: amaldiçoada.

Ana a viu. Lá estava ela. A mulher de vinho. Em meio as outras pessoas, que provavelmente questionavam o que estava se passando dentro da casa, a encarava com seus olhos curiosos e reprovadores. Fez o sinal da cruz, como se tivesse visto uma assombração, uma imagem sinistra. Ana não entendeu seu intento, mas sorriu. A mulher havia lhe mentido. Sua casa não era amaldiçoada. Ali vivia o amor. Fechou a porta e foi até a cozinha.

Era acolhedora como todo o resto. Sobre o fogão de ágata branco havia uma chaleira de ferro. Uma mesa redonda e um armário pequeno. O que era particularmente inusitado e dava um toque especial à cozinha era a grande janela que dava para o jardim dando a impressão de ser um quadro colorido e poético invadindo o ambiente.

Havia um interruptor na parede e ela imaginou que seria da luz que iluminava os jardins à noite. Pressionou-o mas não funcionou. Ela abriu a porta e viu a lanterna dos jardins sem nenhum bulbo. O céu vespertino rosado já dava sinais de que a noite se aproximava. Naquele dia passaria a noite ali. A primeira de muitas.


****


O dano não havia sido tão complexo quanto Ana havia imaginado. O Professor Mauro havia se responsabilizado pelo vitral. O coração trespassado agora encontrava-se íntegro. Eles haviam feito fotos de cada um deles e elas seriam impressas em um artigo da revista da Universidade sobre o trabalho de Benjamin.


****


—Eu compreendo seus sentimentos, Ana — declarou o delegado — mas nós não temos um caso. Os principais envolvidos estão mortos. Não há testemunhas para que você acuse seu avô de assassinato. Isso não passa de invenção de uma empregada idosa que talvez tenha guardado algum rancor de seu avô.

Ana ficou indignada. 

—Não é um caso de sentimentos, e sim de justiça.

—Não há evidência alguma.

—Com todo o respeito, eu o pergunto, o crime de meu pai foi investigado como deveria? Vocês não encontraram nada? Buscaram testemunhas? Ou apenas deixaram passar impunemente? Interrogaram Otho Braun?

O delegado recostou-se na cadeira, cruzou as mãos diante da barriga e olhou-a irônico.

—Ele não estava na cidade no dia em que o crime ocorreu.

—Então, vocês chegaram a cogitar a possibilidade de ele estar envolvido.

Ele suspirou.

—Na verdade, não. Você sabe, as pessoas comentam sem provas e foi apenas uma curiosidade pessoal. Seu avô nunca foi um suspeito.

Ana sentiu-se indo de encontro a um muro. Incapaz.

—Testemunhas?

—Nenhuma.

—Arma do crime. Vocês a encontraram?

Ele se mexeu na cadeira.

—Escute bem, moça. Sabemos realizar nosso trabalho. Me solidarizo com você, mas para que entenda o cenário. A bala transfixou o peito dele e jamais foi encontrada. Infelizmente não sabemos quem foi o autor do crime contra Benjamin.

Ana levantou-se da cadeira e saiu da delegacia com raiva.


****


 —Não é o suficiente para você saber da verdade, e que de certa forma, seu avô pagou por seu crime? — perguntou Obedina preocupada.

—Não. Não é. Eu gostaria que saísse na primeira página do jornal que foi ele quem matou meu pai.

—Você foi até a casa de Melissa?

Ana cruzou os braços. E acenou com a cabeça. Tinha evitado pensar na estranheza daquele dia.  Não saberia jamais expressar os sentimentos sombrios que haviam se apossado dela. A cobra havia mordido antes de ser encantada. Tudo havia sido surreal, incluindo sua descoberta de que João era filho daquela mulher. Havia empurrado a experiência para um canto de sua mente. Se fosse racionalizar, enlouqueceria. Por que de todos os homens daquela cidade, havia se envolvido justo com o filho de Melissa?

—Como minha mãe pode se tornar amiga dela? Ela é tóxica.

Outra pergunta surgiu em sua mente. Como João havia sobrevivido àquela mulher? Ela exalava um controle quase sufocante.

Obedina olhava para as mãos em seu colo.

—Clara vivia rodeada das pessoas que seu pai lhe permitia. Sua vida era como a de um pássaro engaiolado.

Ana imaginava a felicidade que sua mãe vivera naquela casa com seu pai. Cada minuto deve ter sido precioso.

Então, mudando de assunto, perguntou para Obedina.

—Gostaria de vir morar aqui comigo? Esta casa é grande demais para mim.

A mulher sorriu.

—Me parece uma boa ideia. Mas você realmente quer uma velha morando com você?

Ana olhou para ela com gratidão.

—Você é minha família, Obedina. Olhe, amanhã te ajudo a trazer suas coisas, está bem?

—Está bem. Vamos recomeçar.


****


Ana passava todas as horas vagas de seu dia diante dos vitrais do pai. Quando escurecia ela acendia a luz do jardim e ficava ali. Quando Obedina a deixou, pegou um livro de Direito e foi sentar-se no banco de pedra. Não conseguiu concentrar-se. Ia entrar quando ouviu passos. Não eram os de Obedina, teve certeza.

O som se aproximava e ela ficou entre correr e fechar a porta da cozinha ou confrontar o intruso. Quando subia o degrau da cozinha viu João surgir. Seus olhos arregalaram-se e ela ficou muda por um instante. Quis perguntar como ele havia encontrado sua casa. O que fazia ali.

Ele se aproximou da estufa e por um instante ficou olhando um dos vitrais. Ana desceu o degrau e voltou para o jardim. Sentou-se novamente e ficou em silêncio.

— Eu me lembro quando ele estava montando essa estufa. Me lembro desse aqui — apontou para o vitral.

Ela finalmente falou.

—Você esteve aqui com meu pai?

Ele se aproximou dela.

—Ele me fez acreditar que eu o havia ajudado a montar este quebra-cabeça. Ele e sua mãe foram pessoas especiais na minha infância. E de repente... desapareceram. Como se um encanto os tivesse arrebatado de mim. Parecia mesmo verdade o que minha mãe me disse... que eu os havia inventado. Tipo amigo imaginário, sabe?

Ele não sabia como ela reagiria mas sentou-se a seu lado. Ela não se moveu nem o olhou, continuou com o olhar fixo em um tempo que não havia vivido.

—Precisamos ter esta conversa, Ana. Ainda que seja a última. Agora entendo porque você se afastou de mim... mesmo sem saber de nada. Isso é algo muito forte. E eu me sinto cúmplice de assassinato.

— Não...

Ele a impediu de falar.

—Eu me sinto assim, e preciso que você me perdoe pelo que minha mãe fez a seus pais.

—Você não tem nada a ver com isso, João. Você era uma criança... e essa história te atingiu com uma força brutal. Não é o único que se sente atordoado.

Ele a olhou angustiado.

—Eu o vi sendo morto.

O ar ficou preso nos pulmões dela.

—Eu estava lá, Ana. Eu vi seu pai caindo aos pés de seu avô. Mas eu não imaginava...

Ele calou-se e baixou a cabeça.

A surpresa pela revelação e sua compaixão por ele se misturaram e ela emudeceu. Aproximou-se, entrelaçou o braço ao dele e colocou a testa em seu ombro.

—Eu sinto muito, João.

As ações cruéis passadas de outras pessoas, cujas ondulações os atingia no presente, de certa forma, os unira, mas podiam separá-los para sempre. Permaneceram calados, confortados apenas pelo toque um do outro.

Então ele fez a pergunta.

—Você acredita que ainda temos uma chance?

Ela ficou calada. Dolorosamente, Ana sentia como se os últimos resquícios do vínculo que ainda poderiam ser reparados entre ela e João fossem tão tênues, que poderiam se apagar como um sopro sob a chama de uma vela.

Estava confusa.

Tinha medo que não conseguissem superar o peso do ódio, da injustiça e do assassinato. João não tinha culpa das ações de Melissa, assim como Ana não tinha pelas do avô, mas por que não conseguia dizer para ele que eles podiam vencer e ficar juntos? Estava ciente de que se permitisse que aquelas palavras saíssem de sua boca seriam vazias. Sem alma. A verdade era que ela tinha medo do futuro por causa do passado. Temia que as trevas os perseguissem e os colocassem um contra o outro. O tempo podia tanto ser aliado quanto inimigo.

—Não sei —foi honesta.

Ela se levantou e afastou-se dele. Por mais que se solidarizasse com ele, naquele instante nem mesmo conseguiu encará-lo.

—Me desculpe, mas... não sei se consigo...

Cruzou os braços e encarou o espaço.

—Não sei se consigo conviver com você, sem...

Ela não conseguia conviver com ele. As palavras contra ele foram cortantes. Cruéis.

—Sem me lembrar o tempo todo — angustiou-se.   

Sem se lembrar da morte de seu pai.  

Era melhor assim, ela pensou, ou acabariam se destruindo. A distância os protegeria.

João deixou-a silenciosamente.


****


Obedina ouviu Ana falando sobre João e sorriu intimamente. Pousou a xícara cor de rosa com chá sobre o pires e olhou com seus profundos olhos negros para Ana. Aquela história não havia terminado com Clara e Benjamin. O caminho era mais longo e intricado. A justiça poderia trajar-se com várias indumentárias.  

—Benjamin e Clara foram partidos diante de uma cidade que escolheu silenciar. Olhar de lado. Foram enterrados debaixo da indiferença. Será que o sacrifício deles já não foi suficiente? Clara deu o passo mais difícil pulando aquela janela para longe das trevas que a sufocavam. E não fez o que fez para que sua filha rastejasse de volta para lá, anos depois. As últimas palavras de sua mãe foram para que eu a mantivesse longe de seu avô. Não foi um pedido em um leito de morte, Ana. Ela me impôs um pacto. Enquanto se esvaia em sangue aprisionou minha alma com suas palavras. Eu me arrisquei muito para cumprir minha parte. Para quê? Para que você volte voluntariamente para debaixo dessa história opressora? Eu e Clara convivemos com Otho Braun e escapamos a seu veneno, por que não pode fazer o mesmo?

Ana sussurrou.

—Tenho medo.

—Talvez não ame João o bastante. Talvez não o ame de jeito nenhum.

Ana olhou para Obedina assombrada com suas palavras.

—Clara amava Benjamin. Nem o diabo de Otho Braun a conseguiu afastá-la dele. E ela parecia tão mais frágil que você...mas... — suspirou —, talvez eu esteja errada. Afinal, quem pode dizer que alguém é forte ou fraco, se não quando está diante de seu inimigo, não é mesmo? 


****


Anoiteceu.

Ana foi até o quarto da mãe e depois disso saiu de casa.

Caminhou apressada pelas ruas com a atmosfera alaranjada, iluminada por lâmpadas de sódio. Ao alcançar a rua paralela, esperou impacientemente pelo ônibus que a levou ao centro da cidade. Chegando à praça pegou um táxi.


****

João estava sentado na segunda fileira e esperava pelo início da cerimônia, quando viu a mãe entrar. Como sempre, impecável. Jamais se dava por vencida. Ela o procurou com o olhar e ao encontrá-lo sorriu, como se aquela, fosse antes de tudo sua conquista. João desviou seu olhar dela.

Pouco a pouco o auditório foi ficando cheio. Ele viu o pai sentar-se do outro lado, oposto ao da mãe. Eduarda chegou com sua família. Para João, era inacreditável que ela ainda desse confiança a ele depois do que havia presenciado em sua casa. Sentia-se inquieto. A beca o incomodava. Estar diante daquelas pessoas o estava aborrecendo. Só de pensar, que um ano antes, esperara ansiosamente por aquele dia.

Os nomes dos alunos começaram a ser chamados para receberem o grau.

João Monteiro.

Ele levantou-se, foi até a mesa diretiva, recebeu seu diploma simbólico e olhou para a câmera fotográfica que esperava eternizar um sorriso triunfante seu, mas apenas conseguiu um meio sorriso forçado.

Voltou a seu lugar e esperou, meio desiludido, pelo fim da cerimônia.

Quando os capelos voaram, ele apenas segurou o seu fora da cabeça. Começava agora, sua hora mais sofrida. Como imaginou, a mãe apressou-se em sua direção e ele teve medo de sua reação. Ela o tocou e ele permitiu que o entorpecimento tomasse seus sentidos.

—Parabéns, meu filho.

Olhos vazios encararam Melissa, sem dirigir-lhe uma única palavra. Eduarda e o pai se aproximaram dele e o congratularam. Ele esboçou um sorriso agradecido.

—Por que não saímos para comemorar? — sugeriu Eduarda.

—Conheci um restaurante bem agradável — completou o pai — Fica no mirante e podemos ver toda a cidade de lá. 

—É uma boa ideia! — Graziela completou.

Melissa fez um gracejo para Graziela e ela sorriu.

A conversa vulgar começou a irritá-lo. Estavam realmente agindo como se nada tivesse acontecido? Perguntou-se como seus pais haviam conseguido viver todos aqueles anos daquela forma. Varreram toda a sujeira para debaixo do tapete, celebraram dias festivos e aceitaram graciosamente a calma rotina da vida de forma imperturbável. Nada os corroía?

Quando ia abrir a boca para fazer um comentário ácido e declinar o convite, seu olhar foi atraído para um caminhar que já lhe era bem familiar.  Viu a mulher trajando um jeans e camiseta branca indo em sua direção.  

Parou diante dele, olhou-o nos olhos e abriu a boca para falar-lhe, mas como um galho espinhoso se estende para envolver uma flor e machucar quem tente se aproximar, Melissa se colocou-se entre ela e João.

—O que faz aqui? Veio estragar a celebração de meu filho?

Ana olhou-a de forma enérgica.

—Saia da minha frente, Melissa.

—Não! Saia você daqui.

Uma mão agarrou Melissa pelo braço, afastando-a sem muita delicadeza.

—Venha, querida! — o marido sussurrou entredentes para ela. — João precisa de um tempo.

Ofendida, ela olhou para o marido e depois para o filho, cujo olhar feroz desmentia seus modos contidos e ameaçava uma reação desagradável. Caminhou altiva ao lado do marido, de Eduarda e seus pais, mas se recusou a afastar-se muito do casal. Permaneceu em uma distância que garantia que seu olhar intimidador alcançasse Ana. Agia como uma fera enjaulada pronta a atacar.

João esperou. Ana olhou para ele, tomou sua mão e colocou duas alianças em sua palma. Ele nada falou, apenas olhou para os aros dourados em sua mão.

—Eram de meus pais — ela falou hesitante.

Olhou para ele, esperando palavras que não vieram. Ele esperava algo dela. Ana desviou os olhos e encontraram os de Melissa, que a fuzilavam, como seu avô havia feito com seu pai anos antes. Voltou-se para João. Ele estava tenso. A mão havia se fechado sobre as alianças. 

—Se você não quiser mais me ver, eu vou entender, só quero que saiba, que... eu sei que fui covarde naquele dia... — ela olhou para ele com olhos que rogavam que a ajudasse.

—O que você quer, Ana? — João perguntou com a voz estrangulada.

—Eu quero que você fique comigo.

Pronto. Havia dito.

Mas quando as palavras saíram de sua boca, ao invés de alívio, ela sentiu-se abandonada e sem defesas. Melissa e o grupo que a acompanhava a encaravam. Ela cruzou os braços e sentiu vontade de correr. Mas João a puxou para si e abraçou-a. Enfiou o rosto nos cabelos dela e apertou-a.

Ana não se lembrava porque havia afastado João dela. Ela ergueu o rosto para ele e sentiu os lábios dele nos dela com uma intensidade quase dolorosa.

Um instante depois separou os lábios dos dela.

—Você vai conseguir conviver comigo? — ele perguntou.

Ela tocou seu rosto.

—Todos os dias.

—E de que vai se lembrar quando olhar para mim?

—Que eu amo você.

Ele abraçou-a novamente.

—E então, vai aceitar minha proposta? — perguntou ela a seu ouvido.

Ele sorriu.

—O que é? Vai me convidar para fugir?

Ela olhou novamente na direção de Melissa, mas ela não estava mais lá. Havia se afastado. Desaparecido.


—Não. Não vamos precisar. 


FIM

₢Gardenia Yud

Obs: Para os que desejarem ler, o conto 'A CASA' está disponível no blog desde o prólogo. 



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