—Você veio a nossa cidade para
ajudar um malfeitor, e por isso, também será punida.
Ainda desnorteada, Bee foi levada
para a cidade juntamente com Billie. Foram encarcerados em celas separadas, até
que fosse decidido o tipo de pena que pegariam.
Boquiaberta, ela ouviu o veredito
daquele julgamento corrupto. Billie seria enforcado como um exemplo para
aqueles que tentassem se esquivar de cumprir acordos firmados entre cavaleiros e
ela tomaria o lugar dele na padaria de Monsieur Pierre. Não se compadeceu tanto
por si mesma, mas estava destroçada por Billie.
Se soubesse que entrar naquela
vila que era conhecida por ser habitada por gente amigável e alegre, terminaria
em tamanho desastre, teria passado de largo.
A sentença seria aplicada no dia
seguinte, e ela estaria presente para não se esquecer do que poderia
acontecer-lhe, caso tentasse se esquivar da padaria de Monsieur Pierre.
O cadafalso estava posto à praça
pública, a multidão aglomerava-se para assistir ao espetáculo bizarro como se
estivesse em um circo de horrores. O
pobre Billie, de mãos amarradas atrás das costas, subiu a estrutura de madeira
com uma dignidade que a comoveu. Ela jurou a si mesma que não olharia para ele
quando seus pés estivessem agitando no ar em desespero pela última gota de
vida. Os olhos verdes encaravam o espaço à sua frente em uma tranquilidade
quase inumana.
Um homem vestido de vermelho
subiu o cadafalso com um tambor pendurado em seu pescoço por uma tira de couro.
Baqueteava o ritmo dos últimos momentos de Billie. Bee não conseguia deixar os
olhos do rapaz e então percebeu uma mudança neles. Os globos oculares pareciam
que ia saltar das órbitas. Seria temor? Não. Era surpresa?! Com algo mais.
Esperança.
Não apenas ela, mas todas as
cabeças se viraram para onde olhava Billie.
Era apenas um homem.
Simples. Ordinário. Roupas de
agricultor. Cabelos e barba grisalhos. Mas havia algo extraordinário. Um cajado
de madeira e o olhar intimidador. Ele andou entre a multidão que foi abrindo
passagem para ele.
Um sussurro aqui, outro ali, e da
cela para animais de onde estava, ela pode ouvir pedaços de sentenças. O cultivador de sicômoros, disse um. O que veio fazer aqui? Perguntou outro. Perturbar-nos com suas palavras, é só o que
faz em nosso meio, respondeu uma mulher amarga, que em seu vestido de festa
percebeu que a diversão teria um desfecho diferente do que esperava.
O cultivador de sicômoros. Parecia animador, pensou Bee.
Conde Pauli, colocou-se diante do
homem e perguntou.
— Veio assistir a sentença, Amós?
O homem rústico — de vestes e
gestos—, afastou o prefeito para o lado com o braço talhado pelo trabalho duro
e prosseguiu até subir o cadafalso. Olhou
para o tocador de tambor que intimidado baixou os olhos, e depois para Billie.
Removeu do pescoço do rapaz a corda grossa.
O Conde não se deu por vencido.
Subiu apressado ao palco-tablado que havia montado e ordenou.
— Pare! Pare! Não pode chegar aqui
e decidir o juízo. Ele foi julgado e sentenciado a morte.
O olhar do cultivador de
sicômoros era grave.
O conde levantou o queixo e
arrematou.
— Foi justo! Um julgamento justo.
— Eu conheço sua balança — Bee
ouviu pela primeira vez a voz possante do homem polêmico. Virou-se para a
multidão e seus olhos pareceram relampejar. — Vocês tornam o juízo em absinto,
arrastam por terra a justiça e destroem os miseráveis da terra. Não se condoem
do próximo, mas buscam oportunidade para pesá-los e vendê-los. Aos inocentes
pervertem o caminho para levá-los a morte e à vossas mulheres, cobrem com joias
roubadas, enquanto espezinham mais o pobre.
A mulher com vestido
de festa abriu seu leque e começou a abanar-se: ‘ Que linguajar precário! Temos
mesmo que suportar isso?’
—À partir deste dia, não há mais
ferrolho nesta cidade.
E assim dizendo, tomou o braço de
Billie e o removeu do cadafalso. Desceram o tablado de madeira diante de uma
multidão silenciosa e a atravessaram sem que ninguém os impedisse. Foi então
que Billie foi até a cela na qual ela estava presa e abriu-a para que saísse.
Corra, porém, o juízo como as
águas, e a justiça como o ribeiro impetuoso.
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