─ Ana, você está me evitando?
João aproximou-se dela, enquanto saia
da loja.
Ela cruzou os braços diante do
corpo e não encontrou palavras.
─ O que aconteceu? Precisamos conversar.
Estendeu a mão para tocá-la no
braço, mas ela esquivou-se.
─ Não vai dar certo, João.
─ O quê?
─ Não vai dar certo...nosso
relacionamento.
─ Você está me confundindo, Ana.
Espera, vem comigo. Vamos conversar.
─ Não, já decidi.
─ Você não vai nem me dizer o
motivo?
Ela não o olhava nos olhos. As pessoas passavam por eles na calçada, e
ela sentia-se tentada a acompanhá-las, sem dar a ele maiores explicações. Simplesmente,
deixá-lo para trás.
─ Estou trabalhando e estudando
muito, não tenho tempo para... nós.
Ele deu um sorriso amargo.
─ Sei. Se é assim, então, não
houve ‘nós’, em nenhum momento. Era eu, só.
Ele deu as costas para ela e se
foi.
Ela cobriu a boca com a mão.
Estava chocada com o que havia acabado de fazer. De repente, lembrou-se, que
havia visto ele com outra moça. Ele estava jogando com ela. E, claro, ela saiu
perdendo. Queria ignorar os sentimento que gritavam dentro dela. Sentia-se tão
ligada a ele. Mas, teria que conviver com eles por algum tempo. Quem sabe,
conseguiria esquecê-lo?
─ O quê? Você terminou com ele? Ao
menos, perguntou quem era a garota com quem estava?
─ Por que eu faria isso, Jeane?
─ Ana, você, realmente é verde,
no quesito relacionamento, hein? Se deixou levar pelo ciúmes. Já pensou que
podia ser irmã, prima ou apenas uma amiga?
─ Duvido. Ele não tem irmãos.
Jeane deu de ombros e voltou a
organizar as roupas da seção masculina. Um sentimento de inaptidão a invadiu. Sentira
ciúmes, mas não foi apenas isso. Sua insegurança a estava corroendo. Tinha medo
que ele descobrisse a verdade. Não sentia-se à altura dele, e depois, que o
vira com àquela moça, teve certeza que iria se machucar.
Se concentrou nas suas mais
recentes descobertas sobre a casa, para aliviar sua tristeza.
João entrou em casa, rapidamente
e já estava no meio da escada quando foi chamado.
─ Meu filho, como você passa dessa
forma por nós? Nem falou com Eduarda?
Ele parou, respirou fundo e
desceu as escadas. Voltou até à sala, acompanhado por Melissa, e cumprimentou
Eduarda e Graziela.
─ Desculpem-me. Estava distraído.
Olá Eduarda! Como vai, Dona Graziela?
─ Bem, João, obrigada! –
respondeu Graziela. ─ Vim convidá-los para virem este final de semana conosco,
até a fazenda. Vai ser aniversário de meu marido e queremos comemorar apenas
com os amigos mais íntimos. A família de Cidinha Veloso já confirmou presença.
Geovanni terminou o mestrado em Medicina na Inglaterra, e também estará lá.
Vocês podem conversar. Quem sabe, ele não te dá umas dicas sobre as
Universidades de lá?
Ele não estava ouvindo o que ela
dizia, apenas via os lábios dela se mexendo.
─ Meu filho! Graziela está
falando com você.
─ Me desculpe! Sim, claro! ─
disse ele, sem saber direito com o que havia acabado de concordar.
─ Fico feliz que você venha
conosco, João ─ Eduarda o fez aterrissar.
João sorriu e censurou-se
mentalmente pelo que acabara de fazer. Seria o final de semana mais longo de
sua vida.
Ele não dormiu aquela noite. Não
conseguia entender o que havia acontecido. Acreditava que Ana correspondia aos
seus sentimentos, e então ela fazia aquilo. No início de seu relacionamento
teve a impressão de que ela escondia algo dele, depois teve certeza. Isso, ele
havia aprendido a discernir desde cedo. Sua própria família tinha seus segredos
e que escondiam dele à sete chaves. Não havia descoberto ainda o quê. Mas o
peso opressivo do que quer que fosse, pairava sobre ele. Sobre suas vidas. Toda
aquela aparência de perfeição que sua mãe tentava criar e seu pai aceitava
submisso, não o enganava.
Algo o dizia, que era o segredo
de Ana, que fazia com que ela o quisesse longe dela. Havia ficado enfurecido
com sua atitude com ele, naquela tarde. Tivera vontade de arrastá-la até o
carro e obrigá-la a se explicar. Detestava a sensação de impotência e revolta, que
acordava nele, quando tinha que lidar com pessoas que estavam, claramente, desempenhando
um papel diante dos holofotes, enquanto levavam uma vida obscura e sorrateira
nas sombras. Atores! Jamais renunciavam a seu papel! Morriam e matavam por ele.
Mas, logo, descobriria o que Ana tinha
a esconder dele e a faria olhá-lo nos olhos por tê-lo enganado.
Levantou-se de madrugada para
correr um pouco, sentia a necessidade de exercitar-se, a fim de poder conviver com tanta
frustração. Decidiu fazer o trajeto ao redor do quarteirão, até sentir que poderia
terminar aquele dia sem explodir. Fez um breve alongamento e saiu. Alguns
minutos depois, sentiu seu coração acelerar, e uma leve sensação de bem estar
se instalar. Estava certo, o esforço lhe fazia bem.
Olhou à sua direita, e viu a
construção antiga do Orfanato Menino Jesus. O sino da capela dobrou seis vezes,
na última, ele já estava virando a esquina. Deu mais cinco voltas no quarteirão, e entrou
em casa.
₢Gardenia Yud
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